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MPF propõe ação para anular despacho de Ricardo Salles que coloca em risco a Mata Atlântica

Tamoios News
Ministro Ricardo Salles quando visitou Ilhabela em 2019

O Ministério Público Federal (MPF) protocolou nesta quarta-feira (6) ação civil pública pedindo a nulidade do Despacho 4.410/2020, emitido em 6 de abril pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA). A ACP é o resultado de uma ação integrada entre a PRDF e a Câmara de Meio Ambiente e Patrimônio Cultural do MPF (4CCR/MPF), coordenada pelo subprocurador-geral da República, Nívio de Freitas. O ato administrativo coloca em risco o que resta da Mata Atlântica no território brasileiro, cerca de 12% da cobertura original. Isso porque, ao reconhecer as propriedades rurais instaladas em áreas de proteção ambiental até julho de 2008, permite o cancelamento de milhares de autos de infração ambiental por desmatamento e incêndios provocados em áreas de preservação do bioma. O MPF pede a revogação urgente dos efeitos do despacho e a proibição da União de publicar norma de conteúdo semelhante. Também assinam a ação a Associação Brasileira dos Membros do Ministério Público do Meio Ambiente (Abrampa) e a organização não governamental SOS Mata Atlântica.

Baseado apenas em parecer da Advocacia-Geral da União (AGU), o despacho questionado pelo MPF altera o entendimento do Despacho MMA 64.773/2017, que reconhecia a vigência da Lei da Mata Atlântica (Lei Federal 11.428/2006), mesmo após a publicação do Código Florestal (Lei Federal 12.651/2012). “O Despacho 4.410/2020 tem como consequência direta negar vigência à Lei da Mata Atlântica, em especial à vedação de consolidação de ocupação de Áreas de Preservação Permanente situadas em imóveis abrangidos pelo bioma Mata Atlântica, proveniente de desmatamento ou intervenção não autorizada, a partir de 26 de setembro de 1990”, explica o MPF.

Ainda segundo o MPF, o cumprimento e aplicação da nova norma traz como consequência o risco do cancelamento indevido de milhares de autos de infração ambiental em Áreas de Preservação Permanente (APP) situadas no bioma Mata Atlântica, assim como da abstenção indevida da tomada de providência e do regular exercício do poder de polícia em relação a esses desmatamentos ilegais. Segundo a ação civil, apenas no Ibama, e sem computar a atuação de todos os órgãos públicos ambientais estaduais e das polícias ambientais, houve a lavratura de 1.476 autos de infração ambiental na área da Mata Atlântica. Outras medidas em risco são as milhares de recuperações ambientais de Áreas de Preservação Permanente que têm sido efetuadas de modo voluntário ou por meio de cobrança dos órgãos públicos ambientais e do Ministério Público.

Bioma essencial – O MPF sustenta que a preservação da biodiversidade da Mata Atlântica exerce múltiplas funções ambientais, das quais dependem, pelo menos, 150 milhões de brasileiros. Mesmo para setores econômicos ligados ao agronegócio, a preservação e recuperação dos remanescentes de vegetação do bioma Mata Atlântica também são essenciais para a sustentabilidade econômica brasileira, na medida em que a sua degradação causa, entre outros graves prejuízos, a escassez hídrica, a erosão, as inundações, a desertificação e os desabamentos.

A ação lembra ainda que o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado está previsto na Constituição, que também reconhece a Mata Atlântica como patrimônio nacional. A sua utilização apenas pode ocorrer, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais. Na ação civil pública, o MPF pede a concessão de liminar (decisão urgente) para suspender os efeitos do despacho do Ministério do Meio Ambiente e a condenação da União em não editar mais nenhum dispositivo com conteúdo semelhante.

Ação coordenada – A ação civil proposta hoje integra atuação nacional coordenada pela Câmara de Meio Ambiente e Patrimônio Cultural do MPF (4CCR) em defesa da Mata Atlântica. Com a edição do Despacho 4.410/2020 do MMA, a Câmara mobilizou procuradores da República nas 17 unidades da federação que ainda contam com o bioma para evitar que o novo entendimento da pasta – que passa a admitir a presença de atividades agrossilvipastoris, de ecoturismo e de turismo rural consolidadas até julho de 2008 – fosse implementado pelos gestores ambientais localmente. Até agora, foram expedidas 15 recomendações nos estados de Alagoas, Ceará, Espírito Santo, Goiás, Mato Grosso do Sul, Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Sergipe e São Paulo.

Segundo o coordenador da Câmara de Meio Ambiente e Patrimônio Cultural do MPF (4CCR/MPF), Nívio de Freitas, o objetivo da atuação articulada é impedir que a flexibilização da legislação vigente venha causar prejuízos irreparáveis a esse importante bioma brasileiro. “O cumprimento e a aplicação do despacho emitido pelo ministro do Meio Ambiente tem como consequência direta negar vigência à Lei da Mata Atlântica, além de implicar o cancelamento indevido de milhares de autos de infração ambiental e termos de embargos lavrados a partir da constatação de supressões, cortes e intervenções danosas e não autorizadas”, explica o subprocurador-geral da República.

Ministro

O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, concedeu entrevista ao  Tamoios News, no dia 30, quinta-feira passada, para falar sobre o assunto. Ele alegou que o novo decreto não muda nada na Lei da Mata Atlântica.

“Existia um decreto anterior, que de maneira, vamos dizer, sorrateira, em áreas que não eram da Mata Atlântica,  ultrapassou aquilo que a lei determinava. O decreto atual, que está com o presidente, restabelece o marco legal da Lei da Mata Atlântica, que é aquilo que deveria estar em vigor”, alegou Salles.

Segundo ele, nunca deveria ter sido feito um decreto expandido os efeitos de algo, diferentemente, daquilo que estava concebido na lei. Salles argumenta, que o decreto que está com o presidente nada mais faz do que restabelecer o normativo relativo a Lei da Mata Atlântica.

“Não estamos mudando nada da Lei da Mata Atlântica. Absolutamente nada. O que estamos dizendo é o seguinte: Tem uma lei, cumpra-se a lei e não vai além da lei usando um decreto para criar mecanismos e regras que não estavam previstos na lei. Os excessos do decreto anterior vem gerando problemas gravíssimos em vários estados brasileiros. O decreto que está com o presidente prevê que se estabeleça o parâmetro normal da Mata Atlântica. Não tira nenhuma garantia da Mata Atlântica. Não mexe na Lei da Mata Atlântica. Não muda nada”, finalizou.